A cidade oitocentista europeia

O período compreendido entre 1850 e 1900 foi caracterizado por diversas modalidades de complexidades e embates das mais diversas naturezas na sociedade europeia. A cidade clássica e barroca continuavam presentes, coexistindo com novas tipologias protomodernistas. A densidade demográfica sofria forte crescimento, enquanto a industrialização trazia diversas novas formas de conflitos.

Até 1825 (“período napoleônico”), o ferramental barroco continuava em plena utilização por imperadores e monarcas, quase que mera continuidade do que vinha sendo feito no século anterior. É por este motivo que a “cidade oitocentista” costuma ser considerada como aquela da segunda metade do século 19. Ainda assim, cabe observar também que o forte crescimento das principais cidades da Europa e do restante do ocidente também se fez com base nos princípios estruturantes da cidade barroca. Abertura de grandes vias retas e largas, monumentalidade, perspectiva, visuais são elementos presentes no desenho urbano até os dias atuais.

Segundo José Lamas [1, p. 203], “[…] a ruptura que se processa no século XIX é de dimensão, escala e forma geral da cidade. No século XIX, a cidade deixa de ser uma entidade física delimitada para alastrar pelo território, dando início ao aparecimento de ocupações dispersas e à indefinição dos perímetros urbanos. É esta a primeira grande ruptura na morfologia tradicional, que será seguida mais tarde pela ruptura produzida pela cidade moderna.

Uma forma de ver a cidade oitocentista é observar como as referências clássicas são potencializadas pelas novas possibilidades tecnológicas e industriais. O próprio projeto técnico sofre um grande refinamento, e a academia se aprofunda no desenvolvimento de princípios de composição, e de harmonia estilística, utilizando-se para isso de um verdadeiro catálogo de possibilidades visuais de inspiração greco-romana. A mesma erudição clássica é continuada no desenho urbano e em seus elementos até o surgimento do Movimento Moderno.

Surgem inovações de usos que enriquecem as possibilidades de usufruto contemplativo das cidades, como jardins, parques, alamedas e outras conformações de ajardinamento urbano. Enquanto as grandes cidades perseguem e requinte e refinamento, as demais as copiam tanto quanto conseguem até um novo referencial venha a surgir na virada para o século 20.

Outra modificação importante nas cidades veio do desenvolvimento da tecnologia bélica, que acabou por tornar repentinamente obsoleta a muralha como estrutura de defesa. Soma-se a este fato o forte crescimento populacional das cidades e a lógica das necessidades e eficiência de sistemas, e não será difícil entender a demolição das muralhas e a transformação dessas áreas em novos bairros periféricos.

Demolição de muralha e urbanização periférica: o ring de Viena, apresentado por Camillo Sitte
Demolição de muralha e urbanização periférica: o ring de Viena, conforme apresentado por Camillo Sitte

Sem seu limite periférico de contenção, a cidade passa então a se espraiar de forma fragmentada por seu território circundante. Nesta nova periferia surgem áreas habitacionais e industriais. O desejo de se afastar dos elementos nocivos da cidade industrial, as possibilidades trazidas por novas modalidades de transportes e a disponibilidade de terrenos além dos antigos perímetros de muralhas virão então a preparar o terreno para uma era de enorme expansão dos subúrbios urbanos. Mas sobre este assunto, já tratamos inicialmente aqui.

[1] LAMAS, José Maria Ressano Garcia. Morfologia urbana e desenho da cidade. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2000.

Leia também:

A cidade hipodâmica
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21 comentários em “A cidade oitocentista europeia”

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