Se pelo lado ontológico da vida permanecem e se aguçam as características pós-modernas identificados por Harvey e Baudrillard (apesar de nossa arquitetura e mercado imobiliário ainda não as interpretarem adequadamente à cultura nacional), pelo lado metafórico da arte elas se confirmam na mais recente evidência qualificada, em Blade Runner 2049. A condição contemporânea é tão evidente que questões cotidianas aparecem com naturalidade e até certo humor irônico no roteiro que dá sequência ao filme de 1982. Desumanização, fragmentação, virtualidade, predominância da representação sobre o representado, contextualismo são alguns pontos que permanecem de forma harmônica com a época atual, corroborando previsões que não são do início dos anos 1980, e sim (apesar de parcialmente) originadas no romance de Philip K. Dick, Do androids dream of electric sheep?, de 1968.
Os mesmos replicantes que fornecem respostas a necessidades e desejos humanos pouco entendem da real humanidade dessas demandas, numa possível analogia às sombras na caverna de Platão. Um estranhamento que não por acaso se assemelha ao humano atual frente a um mundo em rápida transformação, cujo controle provavelmente não está ao alcance de nenhum indivíduo de nossa espécie. A fragmentação, personalidade definida pelo contexto e a imagem do ser humano incompleto e imperfeito sendo substituído por constructos variados são características que flagrantemente denotam a contemporaneidade de um roteiro do início dos anos 1980, época em que o cyberpunk possivelmente não suspeitava do quão acertadas eram suas previsões. Continuar lendo Blade Runner 2049: a confirmação da condição pós-moderna