Desnecessário repetir aqui o discurso do quanto urbanismo e construção civil são condicionados às taxas de juros. Até em textos defensores de programas habitacionais amplos do início do século passado, pedíamos por crédito reduzido para encaminharmos soluções de moradia digna e saudável para todos. Por toda a América Latina, os defensores mais progressistas da causa denunciavam a urgência do tema, e indicavam o barateamento das obras como única saída possível. Além dos embates da época contra a desnecessária ornamentação, e a denúncia do ostracismo dos estilos, eram necessários ajustes macroeconômicos.
Sempre foram, e assim permanece essa dependência até hoje. Porém, em tempos recentes, a taxa de juro básica de nossa economia, definida pelo Comitê de Política Monetária (Copom) para o Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC) caiu a patamares inéditos, e nada sinaliza qualquer possibilidade de elevação em curto prazo. Além disso, analisando seu comportamento nas últimas décadas, o que se vê é uma clara, consistente e contínua tendência de queda. Observando períodos longos, as elevações momentâneas não passam de desvios ao redor dessa linha de tendência de baixa.
Se, por um lado, isso pode ser uma má notícia para o investidor que se acostumou às altas rentabilidades sem muito esforço, pelo lado real e produtivo da economia, significa crédito mais barato e menor custo de oportunidade do capital. Em outras palavras, fica mais fácil e barato captar crédito para realizar projetos de longo prazo de maturação – característica da parte mais significativa e importante dos projetos urbanísticos, como o project finance.
A grande redução do custo de capital significa que pagar ao longo do tempo pelo investimento pesa menos no resultado econômico-financeiro de toda a operação. Isso é um grande incentivo a que comecemos a desengavetar uma série de projetos que até poucos meses atrás seriam inviáveis. Como este cenário chegou num momento em que os entes públicos vivenciam a penúria fiscal herdada de nossa crise econômica de 2013-2016, nossos municípios e estados não têm fôlego financeiro nem para os mais simples projetos. Por este motivo, muitos estão recorrendo, via concessões ou parcerias público-privadas, ao capital privado ávido por projetos de investimentos. Uma ótima opção neste contexto, já que o investidor está buscando projetos com taxas de retorno estáveis e compatíveis com os riscos assumidos.
Outra grande vantagem urbana dos juros baixos é a crescente atratividade dos contratos de aluguel. Por ser um arranjo financeiro de pagamentos contínuos, o aluguel se atrela ao custo de oportunidade (taxas de juros). Com a taxa SELIC reduzida, a tendência é que pressione o valor dos aluguéis para baixo, inaugurando um momento macroeconômico inédito no país, abrindo possibilidades para encaminhamentos de políticas e programas públicos sem precedentes em nossa história.
Talvez seja hora de revisitarmos a teoria econômica em busca de modelos de juros baixos para planos urbanos e regionais, pois estamos adentrando num território que, até ontem, fazia parte apenas do plano imaginário.
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