A tentação do projeto executivo em PPP

A Constituição de 1988 trouxe uma série de novas obrigações ao Estado brasileiro. Entre elas, um conjunto de princípios para que a administração pública se tornasse mais transparente, eficiente e auditável. Uma das consequências disso foi o surgimento de novo regramento para licitações e contratos administrativos (Lei 8.666 em 1993).

Esse contexto deu espaço para o surgimento de uma cultura de tutela e controle rígidos como caminhos para a contratação pública bem-sucedida. Ou seja, quanto mais detalhado fosse o projeto executivo (acreditava-se), melhor.

Porém, a mesma Constituição também colocou uma série de obrigações novas ao Estado também quanto a prestações de serviços públicos e atendimento a garantias governamentais ao cidadão. O resultado, positivo pelo lado de alguma melhora (ainda que insuficiente) no bem-estar social geral, por outro lado reduziu a margem orçamentária disponível para outros investimentos, cujos recursos não contavam com reservas orçamentárias constitucionais. Foi o caso da infraestrutura, cujos investimentos desabaram dali em diante.

Para resolver esse problema, principalmente num momento de penúria fiscal dos entes federados, passou a ser adotado no Brasil (a partir de 2004) o modelo de parcerias que a Grã-Bretanha estabeleceu com investidores privados para ampliar ativos públicos de infraestrutura na década de 1990.

Para que essas parcerias sejam atrativas ao investidor, é necessário que esses contratos sejam de longo prazo para que haja a recuperação dos investimentos privados no ativo (CAPEX) por meio de pagamentos periódicos (contraprestação pecuniária) por sua operação e manutenção (OPEX). Tais contratos podem chegar a 35 anos de prazo (Lei 11.079/2004).

Por consequência, é necessário permitir ao operador privado (concessionário) certo grau de liberdade no o quê e no como prestar o serviço, sendo mais adequado ao Estado (poder concedente) exigir os benefícios sociais e desempenho esperado. Em vez de exigir e detalhar entradas do processo, passamos a exigir os resultados, as saídas do processo.

Ou seja, a lógica da Lei 8.666 foi invertida (um dos motivos para sua substituição pela Lei 14.133). Porém, a cultura do detalhamento e especificação rigorosa permanece nos entes públicos. Isso é um grande risco, porque quando o Poder Concedente define algo ou toma alguma decisão adicional numa concessão, assume todos os riscos por essa escolha.

Um dos benefícios da parceria público-privada, a transferência de riscos ao parceiro privado, fica mais limitada quando o poder público detalha a solução esperada. Quanto mais o poder concedente conseguir resistir a essa tentação e transferir os resultados esperados para o Caderno de Encargos, colocar as variações toleradas no Sistema de Mensuração de Desempenho, e definir bem a repartição de riscos numa Matriz abrangente e clara, melhor para o próprio poder público.

Leia também:

O que é PPP

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