Aspectos socioambientais no ambiente de negócios

As questões socioambientais já configuram hoje um dos principais conjuntos de preocupações de gestores de negócios e de ativos econômicos. Das cinco maiores preocupações do Fórum Econômico Mundial (Davos 2019), todas são relacionadas a questões socioambientais, sendo todas delas explícitas e diretas. Se a temperatura média do planeta subir mais 2 graus Celsius, boa parte das áreas costeiras (e mesmo alguns paí­ses) simplesmente desaparecem por submersão. Sem falar que passam a existir riscos severos à  existência humana no planeta. Isto aconteceria porque 2 graus em média significa variações de 11 graus Celsius nos polos (para mais ou para menos). As mudanças climáticas significam ambientes mais rigorosos e extremos mais agressivos à  vida humana (vide relatos recentes de calor ou de frio intensos por todo o globo).

É um assunto novo para a humanidade, inclusive para as ciências econômicas, que se definem como aquelas que estudam a alocação de recursos escassos através de modelos que excluem as variáveis denominadas “externas”: os recursos naturais e todas as pessoas. São ciências baseadas em modelos mecânicos e fí­sicos, muito distantes do atual entendimento do mundo como algo circular, finito e regenerativo (premissas da biologia). Porém, nossos modelos de negócios e teorias de administração de organizações (salvo raras exceções) estão muito mais calcadas na economia que na biologia.

As externalidades negativas da atividade econômica geram custos que ainda não começamos a pagar. Ou seja, estamos criando uma imensa dívida socioambiental que ainda não começamos a amortizar. O Earth Overshooting Day é o dia calculado em que entramos no “cheque especial” do planeta, ou seja, quando passamos a consumir mais recursos do que deveríamos para a perenidade de nossa espécie por aqui. Em 2019, esse dia foi 29 de julho. Passamos quase metade do ano gastando o que não podemos repor neste modelo de produção e consumo. Em algum momento, esta variável limitará a produção, portanto afetará o consumo.

A verdade é que isso não preocupava tanto os gestores até pouco tempo atrás, quando começou a ficar evidente que esta conta vai chegar algum dia. Foi quando resolveram calcular quanto isso significaria de impacto no balanço patrimonial, e chegaram a uma conclusão assustadora: o impacto potencial dos custos ambientais sobre os custos operacionais é superior a 50%. E quando as emissões de carbono passarem a ser precificadas (e tudo indica que será em breve), este impacto será sentido imediatamente no balanço patrimonial das empresas. Os custos ambientais da produção mundial foram medidos em torno de 6,6 trilhões de dólares (aproximadamente 11% do PIB global de 2008). E esta geração é extremamente concentrada: 35% deste total é gerado apenas pelas 3 mil maiores empresas do mundo.

A partir deste cenário, John Elkington propôs, na década de 1990, a medição de resultados das organizações em três aspectos: econômico, social e ambiental (triple bottom line, em referência à última linha da Demonstração do Resultado do Exercício – DRE). O discurso de qualificação ambiental e social do resultado sem abrir mão do lucro agradava ouvidos das altas direções corporativas, o que explica boa parte da popularidade desta proposição.

Em 2009, um grupo de suecos ajustou melhor esta lógica hierarquizando os três aspectos em níveis lógicos: a economia não existe sem a sociedade, portanto está nela contida. Da mesma forma, a sociedade não existe sem um meio ambiente, portanto estão nele contidas. E a economia, por sua vez, abriga três grandes setores: financeiro, governo e empresas.

Este novo contexto está acabando com as ações socioambientais “de fachada”, que vinham sendo utilizadas mais como ação de marketing que como ação efetiva e consciente da organização (as assim chamadas ações de green wash). Atualmente, essas condicionantes estão interferindo profundamente nas estratégias das organizações, e existem três grandes atitudes que levam a isso:

  1. Convicção: o gestor acredita no problema e age de acordo
  2. Conveniência: vê o concorrente fazer e entende que pode ser interessante
  3. Compliance: se vê obrigado a fazer (como o Bacen tem feito com as Instituições Financeiras)

Atender às exigências socioambientais não é fácil. Aliás, num estágio atual de descobertas e proposições, é até difícil saber quais exigências são essas. A Consultoria Resultante sugere a seguinte lista de princípios dos investimentos sustentáveis:

  • Conformidade legal
  • Energia renovável
  • Ecoeficiência
  • Descarte de resíduos
  • Considerar a escassez e poluição de água, ar e outros recursos
  • Mudanças climáticas (mitigação e adaptação)
  • Mudanças no uso do solo
  • Perda de biodiversidade
  • Acidificação dos oceanos
  • Ciclos de nitrogênio e fósforo

Essas preocupações já estão interferindo (e muito) no valor das empresas. Um dos casos mais emblemáticos é a Tesla, uma referência de qualidade em carros elétricos. O valor de mercado da Tesla já é superior ao da Ford, mesmo esta última tendo um volume (financeiro inclusive) de produção muito superior ao da Tesla. Este valor não está no tangível, e provavelmente reflete a percepção do mercado em relação ao futuro das matrizes energéticas, muito além do mercado automobilístico.

O conjunto de condicionantes acima exposto indica que, num futuro próximo, grandes impactos serão sentidos: bancos e seguradoras podem vir a sofrer perdas muito significativas; as mudanças climáticas podem provocar fortes impactos em diversos setores da economia, incluindo a produção de alimentos; o mercado de carbono tende a ser mandatário para todos; entre outros.

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