Habitus e o mercado profissional

Futuro

Este texto dá continuidade aos textos anteriores sobre a análise de mercados profissionais, desta vez apresentando o papel da experiência doutrinária e como ela se vincula à prática das estruturas dos mercados. Tal experiência também é conhecida como “habitus”, um constructo psicológico (está na cabeça das pessoas) e social (grupos de pessoas e classes profissionais o possuem em comum). Trata-se de um conjunto de disposições interiorizadas que induz a pessoa a agir e reagir de determinadas maneiras, de forma padronizada. É o produto do que a maioria das pessoas chama de “socialização”.

O elo-chave entre classe e indivíduo é a família, a responsável por transmitir o habitus da classe para a criança. O habitus gera percepções, atitudes e práticas. É também o filtro pelo qual a pessoa interpreta o mundo à sua volta, organizando mentalmente nossas percepções das práticas dos demais e regulando nossas próprias ações. Ou seja, é uma estrutura estruturante.

O habitus é um conjunto ativo e inconsciente de disposições não-formuladas para agir e perceber. Seu poder de estruturar nossas vidas sem que tenhamos consciência disso vem, em grande parte, da ausência da consciência do próprio hábito e do processo de habituação. Ele nos provê de instinto sobre o que fazer em situações práticas no ambiente social. Não determina, guia.

Quando o habitus está corretamente ajustado ao jogo que estamos jogando, nos sentimos confortáveis, naturais, à vontade, porque sabemos como reagir. Nos sentimos “em casa”. Quando mudamos para um outro jogo, imergimos em um ambiente social diferente, nosso habitus pode ser inadequado, nos sentimos pouco à vontade, não sabemos bem o que falar, como nos comportar, nossas reações naturais cotidianas são desabilitadas. Nos sentimos desconfortáveis. E os demais presentes percebem nossa inabilidade decorrente da ausência daquele habitus em nós, gerando uma desvantagem para nossa competição naquele ambiente.

O habitus é uma estrutura que internaliza as estruturas do campo profissional. Se essa enculturação se inicia cedo, é um produto das condições materiais e simbólicas de uma família, moldadas pela classe do indivíduo, ou seja, pelas estruturas maiores da sociedade – é uma incorporação do sistema social como um todo. Cada um de nós carrega na cabeça toda o mapa de nosso espaço social, mas esse mapa é obliterado e se manifesta como ordem evidente em si mesma. Esta é a e experiência doutrinária, e a sensação de estar à vontade para jogar os jogos da sociedade é decorrente de uma estrutura que passa despercebida e sustenta as estruturas sociais que a criaram.

habitus, assim, nos aprisiona na experiência doutrinária, vivemos na ilusão de que somos livres para fazer o que queremos, inconscientes de que há muitas outras pessoas trilhando o mesmo processo estruturado previamente por um contexto muito maior.

[GA]

Saiba mais:

Introdução à administração do escritório de arquitetura Segunda Edição

Gestão do escritório de arquitetura - capa do livro

A principal referência utilizada foi o livro O círculo privilegiado, de Garry Stevens, publicação da UnB, 2003.

[GA] : Esta marca sinaliza textos sobre o tema gestão arquitetônica.

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