O combate ao uso do automóvel nas cidades

Barcelona, 2023: via exclusiva para transporte coletivo sobre trilhos. Automóveis foram banidos deste tipo de via
Barcelona, 2023: via exclusiva para transporte coletivo sobre trilhos. Automóveis foram banidos deste tipo de via

Quanto mais o tempo passa, menor fica o espaço social para o automóvel particular nas cidades. Qualquer iniciativa, política ou programa de sustentabilidade urbana que se preze adota ações de desincentivo ao uso do carro para deslocamentos cotidianos. Não há como desenvolver soluções sustentáveis de mobilidade no longo prazo mantendo este modal com uso intenso.

Qualquer brasileiro habitando uma cidade com mais de 300 mil habitantes percebe facilmente que obras de ampliação viária se tornam obsoletas e insuficientes em muito pouco tempo. Como já se disse, tratar o problema do trânsito alargando vias é semelhante a tratar o problema da obesidade comprando roupas mais largas.

As propostas de transporte urbano que mais funcionam, e que certamente serão as soluções de um futuro próximo, estão muito mais alinhadas com o que se observa hoje em cidades europeias ocidentais e nórdicas. São pautadas pela oferta de um conjunto de ofertas de transporte público de alta, média e baixa capacidade, interconectadas entre si, e aliadas a políticas de restrição ao uso do carro e contenção do espraiamento da mancha urbana (urban sprawl).

Em outras palavras, qualquer plano urbano decente para o futuro precisa incluir em suas diretrizes alguns objetivos básicos:

  • Densidades demográficas mínimas: para que um sistema de transporte coletivo se sustente e se viabilize, a população não pode estar rarefeita e espraiada a grandes distâncias dos centros mais densos, onde se concentram as maiores ofertas de comércio e serviços. Isso não significa ter que aglomerar a população em regiões muito adensadas e verticalizadas, existem soluções de densidades médias que se sustentam no longo prazo, a exemplo de diversas propostas do Novo Urbanismo;
  • Oferta crescente de transporte público de qualidade: enquanto as alternativas não surgem, a mudança de comportamento não começa. A mudança não acontece de uma vez, é um processo lento de migração de opção de transporte;
  • Desincentivos crescentes ao uso do automóvel: aumentar aos poucos o custo do uso do carro e, simultaneamente, reduzir os custos do transporte coletivo. Observe que as tarifas do transporte público precisam se manter em patamares acessíveis para que a população adote a mudança;
  • Políticas de rigoroso controle do espraiamento urbano e do uso e adensamento do solo: o sistema como um todo só funciona se o estilo de vida de subúrbio for uma exceção, e não a regra. E só o poder público local tem o poder de disciplinar esse ordenamento. Uma cidade rarefeita e de baixa densidade terá um custo muito elevado com mobilidade urbana num futuro próximo.

Temos poucas certezas sobre o futuro, e muitas variáveis estão em constante mutação. Mas esta tendência não é uma delas, nem com a crescente adoção do trabalho remoto pós-pandemia pelas empresas de alto crescimento. Não sabemos o que estaremos fazendo no futuro, mas provavelmente não estaremos dirigindo um veículo particular em ambiente urbano como fazemos hoje. Ou, se estivermos, isso terá um custo muito alto ao motorista.

Barcelona, 2023: grandes vias estão perdendo espaço para pedestres, transporte coletivo e bicicletas. Uma única faixa para o automóvel é a regra na região central da Ensanche (Eixample)
Barcelona, 2023: grandes vias estão cedendo espaço para pedestres, transporte coletivo e bicicletas. Uma única faixa para o automóvel é a regra na região central da Ensanche (Eixample).

 

Barcelona, 2023: diversas vias estão virando calçadões e vias de pedestres. O plano municipal é haver apenas uma via para automóveis a cada três vias atuais (mesma proporção dimensional das superquadras do Plano Piloto em Brasília).
Barcelona, 2023: diversas vias estão virando calçadões e vias de pedestres. O plano municipal é haver apenas uma via para automóveis a cada três vias atuais (mesma proporção dimensional das superquadras do Plano Piloto em Brasília).

 

Barcelona, 2023: o espaço de qualidade ao pedestre e a ambiência urbana de qualidade têm prioridade sobre o carro particular.
Barcelona, 2023: maior espaço ao pedestre e a ambiência urbana de qualidade têm prioridade sobre o carro particular.

 

Barcelona, 2023: faixas exclusivas para ônibus são onipresentes por toda a cidade.
Barcelona, 2023: faixas exclusivas para ônibus são onipresentes por toda a cidade. Observe que o carro só possui uma faixa para seu uso.

Saiba mais:

Cidades para pessoas. Jan Gehl

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