Água é vendida barata em São Paulo (considere barato como o preço cobrado menor que seu real valor de mercado). Por diversos motivos nenhum político vai querer corrigir isso, mas é a verdade. A relação de mercado é a seguinte: a demanda pela água é a população total da Região Metropolitana (20,8 milhões de pessoas em 2013, segundo estimativa do IBGE). Já a oferta, esta é mais complicada.
A natureza de São Paulo nos abençoou com alguns corpos d’água serpenteantes na baixa declividade do planalto. Mas nós, imprudentemente, colocamos muito mais gente que o ideal por aqui. Já no século 19 idealizamos represar alguns desses rios, ideias que criariam a Guarapiranga (1928) e a Billings (1958). Mas não seria suficiente para uma população tão grande, mesmo contando com a Cantareira, Cotia e tudo o mais que tivéssemos disponíveis. A verdade é que hoje em dia São Paulo “importa” água de outras bacias, incluindo territórios produtores já no estado de Minas Gerais.
Se dividíssemos a produção natural de água da bacia em que está a cidade de São Paulo pela população que dela se utiliza, estaríamos numa condição semelhante (ou pior) que a de países extremamente áridos, como alguns do Oriente Médio. Mesmo assim, continuamos usando água potável para empurrar as folhinhas de árvores caídas na calçada, comportamento insano do ponto de vista de qualquer cidadão (estrangeiro, em geral) que saiba o real valor da água doce.
Fizemos vista grossa para o comportamento humano até chegarmos a um momento de crise. E chegamos a ele. Agora, quando a produção de água está num ponto de mínima por questões climáticas, resolvemos falar sobre o consumo (demanda). E, mais uma vez, vamos tentando corrigir vícios culturais condenáveis apenas nos momentos de crise, para nos esquecermos deles logo que as primeiras chuvas vierem.
Vários especialistas no assunto afirmam que, num futuro próximo, não faltará água na torneira, mas ela será tão cara que vamos pensar bem antes de abri-la. Não é difícil perceber o real valor da água, basta observarmos que vários refrigerantes podem ser mais baratos que água mineral. Isso acontece porque no refrigerante colocamos, além do gás carbônico, conservantes, estabilizantes, acidulantes e outros “antes” que permitem a utilização de água menos nobre como matéria prima. Água mineral, por outro lado, precisa ser potável, é a commodity de verdade, o bem a ser avaliado. Esta é mais cara por ser mais rara.
Agora resta saber como arranjaremos outros tipos de refrigerante para tomar banho, lavar roupa, lavar louça, usar o banheiro… Sem falar no uso hospitalar, de emergência, preservação da vida… Trata-se de um bem muito importante para ser precificado levianamente. E isso precisa ficar claro antes que seja tarde.