O que é Operação Urbana?

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por Ricardo Trevisan, arquiteto e urbanista

Há uma explicação interessante sobre o que é Operação urbana no site do Prof. Dr. Csaba Deák, da FAUUSP: (…) um instrumento de intervenção de política urbana (…). Sua origem remonta às ZAC-s (Zones d’Aménagement Concerté) da França e nas experiências em São Paulo de ‘operações interligadas’ esboçadas já do no final dos anos 1980, onde se tornou largamente utilizada em áreas com potencial de intensificação do uso do solo. A figura de operação urbana foi legalmente consolidada no Estatuto da Cidade promulgado em 2001 (Seção X).

A  definição legal de operação urbana pode ser encontrada no Estatuto da Cidade, e é citado pelo site Vitruvius:

“§1º Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental”.(Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257 de 10/07/2001)

Na prática, a Operação Urbana é o meio de viabilizar um projeto de renovação urbana utilizando também recursos da iniciativa privada. Para entendê-lo é preciso primeiro entender alguns outros instrumentos de política urbana.

Em geral, os Planos Diretores fixam três Coeficientes de Aproveitamento (CA) de referência (o CA diz a relação entre área construída e área do lote):

a) CA mínimo: abaixo deste valor entende-se que a terra urbana está sendo subutilizada, portanto pode sofrer restrições, ser notificada, receber aumento progressivo de IPTU e até desapropriada com títulos da dívida pública a serem resgatados em até dez anos. O objetivo é que a função social da propriedade do solo urbanizado seja respeitada, conforme prescrito na Constituição Federal de 1988 e no Estatuto da Cidade;

b) CA básico: até este valor, considera-se que o adensamento provocado não impacta de forma significativa a infraestrutura e os equipamentos oferecidos pela cidade. Ou seja, se a construção não ultrapassar este nível, não será necessário ampliar redes de água, esgoto, transportes, nem aumentar oferta de creches, escolas, postos de saúde, etc. Portanto, para construir até este CA nenhuma contrapartida será devida à prefeitura.

c) CA máximo: é o máximo que se pode construir pagando a contrapartida à prefeitura. Este pagamento é estabelecido no Estatuto da Cidade como Outorga Onerosa do Direito de Construir. Os recursos arrecadados são revertidos em obras públicas, em geral nas periferias das cidades, que são as áreas mais carentes de infra-estrutura urbana. A Outorga Onerosa costuma ser paga em dinheiro para um fundo específico administrado por um conselho gestor paritário.

A Operação Urbana é um instrumento de renovação urbana. Ele é capaz de viabilizar a completa reforma de setores urbanos inteiros, completamente. Mas, para isso, precisa ser usado com inteligência e comandado por pessoas que entendam seu potencial urbanístico. Em geral, no Brasil, não é o que acontece.

Como funciona a Operação Urbana

A prefeitura delimita a área da Operação Urbana em seu Plano Diretor ou numa lei específica que o estabelece. Dentro destes limites, a Outorga Onerosa passará a ser paga de outra forma, não mais para um fundo de todo o município, e sim para um fundo específico da Operação. Os recursos deverão ser aplicados apenas na área da Operação.

O ideal é que a Operação seja viabilizada através de CEPACs (Certificados de Potencial Adicional de Construção), também previstos no Estatuto da Cidade. Sua vantagem reside na exigência de transparência por parte do Poder Público, porque o CEPAC é um título de valor mobiliário, portanto precisa ser aprovado pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários, Ministério da Fazenda).

Como funciona o CEPAC

O município emite o CEPAC como um título que garante o pagamento da outorga onerosa na área da Operação. Os empreendimentos dentro dos limites da Operação só poderão construir acima do CA básico com CEPACs. A venda é feita em várias distribuições, cada distribuição feita através de um ou mais leilões públicos. Em São Paulo, estes leilões são feitos na Bovespa. É aqui que reside uma das maiores inteligências do instrumento da Operação Urbana: à medida que as obras são realizadas, o valor da terra sobe, o valor do CEPAC também sobe. A prefeitura arrecada mais, acelera as obras, a terra valoriza ainda mais, o valor do CEPAC sobe ainda mais, e o processo entra num círculo virtuoso em que a mais-valia do processo é apropriada pelo Poder Público, que pode investir em habitação social, transporte coletivo, redesenho urbano, área verdes, obras contra enchentes e todas as demais obras que foram estabelecidas quando a Operação foi idealizada.

A emissão de CEPACs é regida por instrução normativa da CVM, portanto há grande exigência de transparência para o investidor. A prefeitura precisa detalhar, no prospecto do CEPAC, quais obras serão executadas, onde, em que prazo e quanto custará. As distribuições devem ser vinculadas às obras para que a Operação possa ser auditada com clareza. Portanto, a crítica que se faz às Operações Urbanas de que as obras custam muito mais do que o valor arrecadado é facilmente rebatida quando a emissão de CEPACs é feita de acordo com as exigências da CVM.

Outra vantagem é que, ao respeitar as exigências da CVM, o prospecto costuma ser elaborado em conjunto com instituições financeiras habituadas a emitir títulos e valores mobiliários, como ações e debêntures. Portanto, há um cálculo financeiro transparente e coerente de seu valor mínimo, de sua viabilidade econômica e de sua absorção pelo mercado.

15 comentários em “O que é Operação Urbana?”

  1. Prezado Trevisan, parabens pela clareza de seu texto !
    Te peço, por favor, explicar como como que uma Prefeitura, que para financiar a obra pública, logo antes da realização da intervenção, pode se beneficiar da valorização dos CEPAC’s ? Pois, mesmo que os títulos venham a se valorizar, após a finalização da intervenção, a Prefeitura não se encontraria mais em posse dos mesmos, uma vez que a venda destes tenha custeado a intervenção .

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    1. Wagner,

      Os CEPAC não precisam ser leiloados todos de uma única vez. O ideal é vincular cada obra ou conjunto de obras a uma distribuição de CEPAC, e cada distribuição pode ser dividida em vários leilões. Assim, a prefeitura vai se apoderando da valorização urbana através da valorização dos CEPAC. Ficou claro?

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  2. Ricardo,

    você já deve ter lido, mas os seus leitores talvez não:

    “A urbanização e o falso milagre do CEPAC” João Sette Whitaker Ferreira e Mariana Fix

    Contribui bastante para a discussão.

    A explicação sobre os CEPACs está bastante didática mesmo, entendi melhor algumas coisas, mas não acredito que esse instrumento tenha contribuido para melhorar as condições da nossa metrópole.

    Abraço

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    1. Bruno,

      Concordo que nossas operações urbanas não produziram melhoria de qualidade urbana de forma democrática e equânime, pelo menos até agora. Mas não confunda o instrumento com o mau uso que é feito dele. É como uma faca, foi feita para usos nobres, mas nas mãos erradas vira uma arma branca.
      O problema é que as operações urbanas infelizmente são usadas como instrumentos de arrecadação pelas prefeituras, como plataforma política e são comandadas por políticos. Mas é um instrumento inteligente, se for utilizado com sabedoria, pois é uma forma de capturar e socializar a mais-valia produzida pelo capital privado.
      A operação financeira de Beirute é a prova disso.

      Um abraço,

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  3. Nota-se que o investimento na Operação Urbana tem um preço muito elevado, apesar de se dizer que os títulos do CEPAC são emitidos de forma transparente. Mas quando se mistura o poder privado com o publico tem sempre as vantagens financeiras. Os investidores tem profissionais inteligentes habilitados para verificar a viabilidade do lucro a meio e longo prazo na Operação Urbano delimitada. Diante desse fato a compra dos títulos CEPAC as vezes não conseguem tem seus preços valorizados. Por ex. Operação urbana Agua Branca – paralisada e operação urbana Aguas espraiadas na região do Jabaquara – A primeira travou por razão da ferrovia e a segunda por questões social de implantação de moradia popular. Por favor se houver HIS de três SALARIOS mínimos estou dentro. A população Brasileira a media salarial é de C$1.200,00 reais. Já pensou ter (HIS) meu Apto. numa região onde o preço da terra e Hipervalorizado ou seja custar c$20.000,00 mil reais o M2. Sonho meu..

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    1. Prezado Arlindo,

      Os investimentos urbanos, especialmente os de revitalização, são sempre elevados. E isso nada tem a ver com transparência, são variáveis independentes entre si. Vantagens financeiras podem existir para ambos (público e privado) se a operação for bem construída, e ajuda se o mercado secundário para CEPAC estiver bem desenvolvido. Se o CEPAC não se apreciou entre um leilão e outro, o ideal é estudar por que isso ocorreu antes da colocação de outro lote. A paralização de uma Operação Urbana demonstra falta de gestão do processo, porque isso não deveria ocorrer sem uma justificativa muito forte, já que há muitos investidores aportando capital para que a transformação urbana aconteça. A definição de HIS (habitação do Minha Casa Minha Vida financiada com recursos do FAR) é unidade habitacional para famílias com renda de zero a três salários mínimo. Isso existe de verdade, e o cadastro é feito pela prefeitura. HIS deve ignorar valores de mercado, pois essas famílias não conseguem autofinanciamento para adquirir sua unidade habitacional, por isso há o subsídio estatal. Espero ter respondido a seu questionamento.

      Abraços,

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  4. A explicação sobre o CEPAC deve ser corrigida.

    “A principal “inovação” da Operação Faria Lima foi seu sistema de venda de potencial construtivo através de um de título financeiro, o Cepac – Certificado de Potencial Adicional de Construção . Como qualquer título financeiro, seu preço oscilaria conforme o mercado, na Bolsa de Valores e Futuros: poderia cair, se a Prefeitura emitir muitos títulos e não houver procura, ou subir, se a mudança de zoneamento ou algum atrativo provocar muito interesse no mercado imobiliário. Os Cepacs serviriam também para pagar a desapropriação de imóveis para obras públicas. Entretanto, esses títulos motivaram uma acirrada polêmica, sobretudo por causa da desvinculação que criavam entre a compra do direito adicional de construir e a posse do lote. Qualquer um poderia comprar o título, independentemente de ter ou não um lote na região, gerando um novo tipo de especulação imobiliária “financeirizada”. Entretanto, mesmo aprovado em março de 1995, o título não foi ainda lançado no mercado e a Prefeitura utilizou-se de um instrumento previsto na Lei da Operação: graças à autorização especial dada por um decreto do prefeito, as contrapartidas poderiam ser pagas em moeda corrente nacional e não em Cepac. Desta maneira, compra-se, em vez de um título, o “equivalente ao Cepac” ”

    http://www.fau.usp.br/docentes/depprojeto/j_whitaker/fixopurb.html

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    1. Beatriz,

      Obrigado pela colaboração. Mas discordo da criação de especulação imobiliária, uma vez que a operação estimula a efetivação dos empreendimentos. Haveria uma especulação financeira positiva, por fomentar a atividade econômica, como ocorre no mercado de opções e futuros. O CEPAC dá transparência por ser uma securitização sujeita às regras e controle da CVM. Ainda engatinhamos no que diz respeito à utilização do mercado de capitais para o desenvolvimento urbano.

      Abraços

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  5. Olá
    Gostei muito do seu site. A forma com que explicou é bastante clara, muito elucidativa.
    Há algum livro que possa recomendar para maiores informações sobre o uso do cepac, de forma genérica ou, preferencialmente, sobre seu uso na cidade de São Paulo? Acho que esse é um instrumento de muito potencial, se usado de forma apropriada.
    Muito Obrigada

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    1. Elaine,

      Os livros sobre o Estatuto da Cidade podem lhe ajudar bastante. Não tenho um específico para lhe indicar.

      Abraços

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